As emissões de gás carbônico cresceram 2% em 2018 e 2,4% em 2019. Se todos os países cumprissem as metas estabelecidas no Acordo de Paris, a temperatura da Terra, ainda assim, subiria 3 graus centígrados. Só que as mudanças de comportamento não estão acontecendo e o resultado dessa lentidão é que em 2050 a temperatura da Terra poderá chegar a 5 graus (6 em algumas áreas), ampliando para níveis inimagináveis a intensidade, a frequência e os riscos de eventos extremos de seca e chuvas que temos visto.
Alguns dados para não se perder nesse entorpecimento: 10% do total de emissões de gases de efeito estufa estão relacionados aos desmatamentos das florestas tropicais. Os outros 90% resultam da queima de combustíveis fósseis (ou seja, do consumo de petróleo e derivados). Ou seja, o aquecimento é uma consequência da atividade humana.
Mas, se fomos responsáveis pela situação do planeta chegar até aqui, também podemos desempenhar o papel fundamental de frear e reduzir as emissões de gases de efeito estufa. Há tecnologia, técnica e ciência robusta para isso. O que falta é sair da apatia e acelerar as medidas práticas de reversão.
“Embora as pessoas estejam cientes das mudanças climáticas, o olhar ainda é míope e o problema não é visto como prioridade. Há um imenso gap entre a vontade e a ação”, insiste a professora Gabriela Di Giulio, da Faculdade de Saúde Pública da Universidade de São Paulo.


É preciso agir já
Gabriela sabe o tamanho do desafio que tudo isso implica, por isso mesmo o divide em três atuações importantes e simultâneas na esperança de que as pessoas compreendam e se mobilizem. “Há uma necessidade urgente de zerar o desmatamento e rever modos de produção e de consumo que são completamente dependentes de combustíveis fósseis. Essas questões não são simples de serem resolvidas. Envolvem uma diversidade de atores, disputas e interesses. Por isso exigem uma resposta coletiva. É preciso algo que a ambientalista Samyra Crespo fala, que é uma alfabetização ecológica. Buscar se informar e se engajar”.
A segunda variável importante é a resposta institucional. “É pensar que nossas escolhas e decisões políticas têm enorme repercussão. Quem eu elejo? Os políticos que eu escolho estão alinhados com essa necessidade de mitigação dos efeitos do aquecimento global ou não incorporam essa agenda em suas propostas? O poder do voto é extremamente vital. Afinal, os governantes que escolhermos serão os grandes tomadores de decisão”, pontua.
E, finalmente, o terceiro elemento que a professora destaca são as escolhas pessoais que fazemos enquanto consumidores. “Nesse caso, por exemplo, é se questionar: procuro alimentos saudáveis do ponto de vista nutricional e que estão alinhados à sustentabilidade? Compro de pequenos agricultores que evitam o uso intensivo de agrotóxicos? Dou preferência a um tipo de transporte menos poluente? A sustentabilidade não vai escolher o dia do clima ou outros momentos específicos para perpassar sua vida. Ela perpassa o tempo todo.”
Precisamos entender que o protagonismo é de todos. Porque as mudanças climáticas tocam a todos e algo precisa ser feito agora. Pensando nisso, elencamos algumas iniciativas em que você pode se engajar hoje mesmo:
1. Reduza o desperdício de alimentos
Você já deve ter ouvido falar que um terço da comida produzida no mundo é desperdiçada. Mas não é só a maçã que apodreceu na fruteira ou o arroz que sobrou no prato que vão para o lixo. Uma série de recursos necessários para a produção dos alimentos – sementes, água, energia, terra, fertilizantes, horas de trabalho, capital financeiro – também são jogados fora. Calcula-se que todo esse desperdício seja responsável pela emissão de 8% dos gases de efeito estufa globais porque o lixo que vai parar nos aterros acaba gerando gás metano, que retém muito calor e está diretamente associado ao aquecimento da atmosfera terrestre. Para estancar o problema, é essencial mudar alguns critérios de consumo entre as pessoas de renda mais alta que provocam um desperdício por opção. Sabidamente varejistas e consumidores rejeitam alimentos feios, com deformidades e de cores não tão exuberantes. Iniciativas como a da loja Fruta Imperfeita (www.frutaimperfeita.com.br) alteram esse mindset ao mostrar que nem todo alimento precisa parecer ter saído da fábrica para ser gostoso. Imperfeições são normais e o valor nutricional não é menor por isso. Também ajuda a conter o desperdício pedir uma porção menor no restaurante, dividir a sobremesa e levar o que sobrou para casa. Por último, vale desviar de promoções como “leve três e pague dois”, que comprovadamente gera consumo exagerado e o descarte de boa parte dessas mercadorias não planejadas. Para saber mais dicas de consumo consciente acesse www.akatu.org.br.

2. Consuma mais vegetais e menos carne
De acordo com um estudo de 2016, na Universidade de Oxford, as emissões de gases de efeito estufa causadas pela dieta ocidental, rica em carne, podem ser reduzidas em até 70% com a adoção de uma dieta vegana e 63% com uma dieta vegetariana, que inclui queijo, leite e ovos. As razões dessa, digamos, solução climática é justamente a abstinência de carne vermelha. A pecuária é responsável por um quinto das emissões de gases de efeito estufa. Em parte por causa da eliminação do gás metano enquanto as vacas digerem seus alimentos. Em parte, porque para ter pasto é necessário desmatamento. A campanha segunda sem carne, lançada no Brasil em 2009 pela Sociedade Vegetariana Brasileira em parceria com a Secretaria do Verde e Meio Ambiente da prefeitura de São Paulo, colabora nesse sentido. A princípio, ela se resume a tirar a proteína animal do cardápio, pelo menos uma vez na semana gerando benefícios para a saúde das pessoas, para o meio ambiente e para os animais. Confira www.sbv.org.br.
3. Conheça e compre de pequenos produtores
Sempre que possível compre alimentos orgânicos, de pequenos produtores ou de manejo biodinâmico, sintrópico ou outro método de agrofloresta que respeite o solo e o indivíduo. No Instituto Chão, em São Paulo, há uma feira, uma mercearia e um café com produtos orgânicos e artesanais, onde é possível comprar diretamente do produtor. Confira www.institutochao.org.
4. Produza menos lixo
A criadora do blog Um Ano sem Lixo, Cristal Muniz, vive evitando produzir lixo desde 2015 e reuniu suas preciosas dicas no livro Uma Vida Sem Lixo (editora Alaúde, 200 páginas). Há sugestões para a limpeza da casa usando apenas vinagre, bucha vegetal para lavar louça, receitas culinárias que permitem aproveitar a casca dos alimentos, além de receitas de cosméticos caseiros e como montar um guarda-roupa sustentável. De tão múltiplas saídas para tudo, a sensação é de que, tanto os posts do Instagram quanto o livro funcionam como um curso lixo zero que parte das soluções mais básicas de reciclagem e redução de consumo até as mais complexas como construir uma composteira. É possível pinçar dicas e ir se engajando no ritmo que lhe for mais conveniente. Além disso, como Cristal faz esse trabalho de coleta de informações sozinha (escreve, fotografa, edita vídeos, pesquisa soluções e responde comentários), quem se identificar com o conteúdo que ela produz, pode escolher contribuir com R$7 mensais para que ela continue pesquisando, de maneira independente, informações que tragam maior autonomia para suas escolhas. Acesse www.umavidasemlixo.com ou o Instagram @umanosemlixo.

5. Diminua o uso de plástico
Quer mudar seu consumo e a relação com o planeta e não sabe por onde começar? A filosofia zero waste, que pauta a loja Mapeei – Uma Vida Sem Plástico, de São Paulo, é um ponto de partida. Depois de muita pesquisa, as proprietárias Lívia Humaire e Lori Vargas, reuniram informações e produtos que ajudam quem está na transição para um estilo de vida mais ecologicamente sustentável – e por isso mesmo, quer distância do plástico, material cuja produção ultrapassou o limite suportável do planeta (por ano cerca de 12 milhões de toneladas do material são jogadas no mar). Entre os itens disponíveis: kit com saquinhos multiuso, porta-legumes, bioembalagem orgânica, copo retrátil, escova dental de bambu (aliás, fique de olho nessa matéria-prima), absorventes de tecido, xampu em barra (sem embalagem), canudinhos de inox. Tudo se soma na tentativa de resolver problemas como o fato de que 40% do plástico produzido no mundo tem menos de 20 minutos de uso e logo depois é descartado e apenas 9% desse descarte é efetivamente reciclado. Confira www.umavidasemplastico.com.br.
6. Incentive um projeto social
Entre tantos projetos que aliam bem-estar social e climático, o Gastromotiva merece destaque. A ONG criada pelo chef David Hertz já formou 5500 alunos em cozinha profissional, venda (para quem pretende ter um negócio na área) e gastronomia social, que desenvolve um olhar mais integral para o preparo dos alimentos reduzindo o descarte. É possível atuar como parceiro da ONG – se você tem um restaurante e precisa contratar novos cozinheiros, por exemplo – ou fazendo uma doação. Nesse caso, dependendo do valor doado, pode-se custear um curso de gastronomia (gratuito) para jovens em situação de vulnerabilidade social (ajudando a dar uma profissão a quem sequer tinha oportunidade de emprego), contribuir para que a Gastromotiva sirva mais pessoas nos jantares sociais que promove, por exemplo, em comunidades do Rio de Janeiro. Ou patrocinar um workshop sobre como combater o desperdício dentro de casa para um casal da comunidade. Saiba mais em www.gastromotiva.org.

7. Compartilhe, troque, compre em brechós ou apoie pequenos fabricantes.
Quão ética é uma marca de roupas? Na Austrália, a Good on You é uma plataforma digital que ajuda o consumidor a descobrir o grau de sustentabilidade de uma marca (uso de material ecológico, energia renovável, se mantém funcionários contratados, paga um salário justo, emite o mínimo possível) permitindo fazer uma escolha baseada nos princípios de respeito ao planeta, aos animais e aos trabalhadores. Para se ter uma ideia da credibilidade da plataforma, ela atraiu a atriz Emma Watson, que se tornou apoiadora da iniciativa. Embora ainda não exista uma plataforma parecida no Brasil, podemos usar alguns critérios da Good on You como guia. Afinal, uma das indústrias mais poluentes do mundo é a da moda. E não são raros os casos de trabalho análogo ao escravo associado à fast fashion. Portanto, é cada vez mais importante saber a procedência da peça que você quer comprar. Quem trabalha com algodão orgânico, sabidamente, usa 30% menos água no processo, o que significa menos impacto na pegada de carbono. E também vale visitar mais brechós, trocar roupas entre amigos ou, como já existe, fazer parte de um clube com assinatura mensal, para compartilhar o guarda-roupa. Confira as iniciativas www.ecotece.org.br e www.aroupateca.com.
8. Considere andar mais a pé, de bicicleta ou transporte público
Segundo o Instituto Clima e Sociedade, organização filantrópica que busca o engajamento de diferentes setores da sociedade dedicadas à construção de soluções para a crise climática, o transporte de passageiros é a principal fonte de emissões de gases de efeito estufa em cidades brasileiras e a maior parte dessas emissões vem do automóvel. Substituir o uso do veículo é, portanto, a medida mais urgente. As bicicletas estão em alta nesse quesito porque ao mesmo tempo que desembaraçam o tráfego, desobstruem o ar e ainda fazem bem para a saúde. Atuando nessa linha, uma comunidade de ciclistas voluntários e apaixonados pelo seu meio de transporte ajuda quem está querendo pedalar e não se sente seguro. É a Bike Anjo. Na plataforma é possível encontrar um bike anjo mais próximo a você, recomendações de rotas, acompanhamento no trânsito. Confira www.bikeanjo.org.
9. Apoie o engajamento dos jovens
Uma adolescente de 16 anos, Greta Thunberg, da Suécia, se tornou uma das faces mais famosas do movimento mundial de combate às mudanças climáticas. E ela não está sozinha. Ao contrário. Por todos os continentes, uma legião de jovens se une com o mesmo objetivo. Por aqui, esse trabalho é feito com competência pelo Engajamundo. A ideia é que “Mudando a si mesmo e o seu entorno e se engajando politicamente é possível transformar a sua realidade”. Isto é ser parte da solução relacionada às mudanças do clima, defendem os jovens da organização que tem, entre suas missões, levar jovens brasileiros para participar de conferências da ONU. Não só. Ser parte da solução pode ser mais simples, como plantar uma árvore ou consumir menos carne, não utilizar canudinho plástico, fazer horta ou criar abelhas sem ferrão. Quem tem acima de 29 anos pode contribuir financeiramente para que esse ativismo não se dilua. Confira em www.engajamundo.org.
10. Faça parte de um coletivo
Ainda dá para Salvar a Amazônia? Posso plantar uma floresta? Quais as propostas do Brasil no Acordo de Paris? A organização em coletivos, que tendem a ter uma participação mais ativa nessa arena decisória, é uma forma de ativismo, engajamento e compromisso que tem emergido com bastante força e provocado uma forma mais horizontal de provocar debate. E não importa o tamanho, nem a área de atuação. Há coletivos focados em mobilidade urbana (www.corridaamiga.org), revitalização de espaços públicos (www.novasarvoresporai.com.br), criação de hortas urbanas para aproximar as pessoas de onde vêm os alimentos (www.hortaurbana.com.br). São as micro e macrorevoluções urbanas a seu dispor. Para questões relacionadas à Amazônia, entre em www.wwf.org.br.
